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sábado, 30 de março de 2013

Memórias de Família I


AS LEMBRANÇAS DE MINHA MÃE

 

Minha mãe aos 6 anos de idade - 1932 Alegrete RS

Quero falar algo sobre a minha mãe e de algumas lembranças que tenho dela. Ela foi sempre muito dedicada a todos nós. Gostava de limpar a casa e manter as coisas em ordem. Quando passava cera e encerava o chão, o apartamento ficava em “estado de graça”. Parecia que tudo voltava ao seu início, isto é, àquela condição de “como deveria ser” um lar.


Era uma boa cozinheira e caprichava, quando havia convidados para o almoço ou jantar. Lembro-me do seu antigo livro de culinária Dona Benta. Naquela época, havia um programa de culinária na TV da Dona Mimi Moro, que nós gostávamos de assistir. Acho que não era tão brigona como eu sou, que fico furiosa quando as coisas ficam bagunçadas. Era mais tolerante com os filhos.



Minha mãe com o papagaio Louro - 1948 Alegrete RS


Ela sentia falta de ter uma profissão, um trabalho para que pudesse dispor de dinheiro para as suas necessidades. Meu pai não admitia que trabalhasse fora e deixasse os filhos sem assistência. Ela tinha muitos talentos. Sabia costurar. Fez até um curso de corte e costura. Fez muitas roupas para nós. Teve uma máquina de costura, daquelas pretas antigas de pedal, e depois outra máquina elétrica anos mais tarde. Nunca consegui lidar com aquilo. Não levo jeito para costurar com máquina. Houve um tempo em que ela trabalhou, por assim dizer, para uma lojinha na Rua Riachuelo, esquina com a Rua Caldas Júnior. Fazia roupas de crianças, como babeiros, camisas de pagão, etc., inclusive bordados. Para mim, fez vestidos, como aquela jardineira preta de feltro com aplicações de desenhos infantis e bordado com miçangas. Gostava muito desta roupa.


O casamento na cidade de Alegrete - 1949


Ela fez depois um curso de bordados, e fazia isto como ninguém. Lembro-me que ela tinha um “porta-linhas”, que confeccionou à máquina, onde eram colocadas ao comprido as meadas das Linhas Varicor. Bordava com miçangas, fios metálicos, linhas matizadas de seda, era um primor... Fez outro curso de bijuterias, e lembro-me de um colar de miçangas de várias voltas que fez para a sobrinha Alfonsina. Era da cor amarelo-âmbar. Era muito bonito. Às vezes, procuro estas casas que vendem bijuterias, para ver se encontro um parecido. Gostaria de tê-lo, pelo menos para ficar olhando para ele.


Festa de encerramento de um de seus cursos de artesanato  - 1983 Porto Alegre RS


Sabia fazer tricô. Fez blusas, casacos, mantas, xales e outras peças. Dela, ainda tenho os sapatinhos e gorros que fez para a Fernanda, quando esta ainda nem havia nascido. Tenho um sapatinho seu chamado de “Peter Pan”, com um pompom na ponta do pé. É um modelo que sabia fazer desde os seus tempos de mãe de primeira viagem. Fazia também crochê. Com ela aprendi os pontos básicos de tricô e de crochê. Fiz casacos e blusas, mas quando estava na adolescência. Ensinou-me também alguma coisa de bordado.



Depois, aprendeu a pintar em tecido, fez um curso de macramê e outro de bordado em talagarça. De macramê, fez bolsas e outras aplicações. As bolsas eram forradas e muito bem feitas. Certa feita, aprendeu um ofício: o de fazer empacotamento. Esperava poder trabalhar. Já tinha mais de 60 anos de idade. Mas não chegou a dar certo. Não sei se esqueci de mais algum curso...



Quando era menina, lembro-me de suas carteiras e bolsas sociais, dos leques, das luvas ¾, do colar de pérolas que o pai lhe deu de presente, do seu pó-de-arroz e do batom. Não usava outras maquiagens. Lembro dessas coisas que as meninas gostam de olhar e de usar e que pertencem às suas mães.



Festa de casamento: roupas e penteados dos Anos 60 - Porto Alegre RS


Ela gostava de contar as histórias de quando era menina, de falar do seu “papai” e da sua “mamãe”, como os chamava. Falava do gato “Mimi”, que uma vez fez sujeira e a irmã de criação esfregou o focinho dele na mesma, para que nunca mais fizesse aquilo. Teve também um cachorro, mas não me lembro do seu nome. Ela tinha muitas saudades da sua infância. Seu irmão tinha 19 anos a mais do que ela, e não teve um irmão com quem brincar. Gostava também de se lembrar de seus tempos do Colégio Ruy Barbosa, das suas amigas de internato no Colégio Nossa Senhora da Medianeira, amizades essas que cultivou até a sua morte.



Ela e o pai tiveram criações diferentes. O pai sofreu muitas privações, sobretudo em sua infância, o que fez dele uma pessoa um tanto reservada. Acho que posso dizer que ela se conformou com a situação de criar os filhos e não poder trabalhar fora. Acredito que seu amor por ele era verdadeiro, pois não o deixou desamparado, nem mesmo quando o pai ficou muito doente. A doença dele, na verdade, consumiu bons anos de sua saúde e de suas alegrias. Ficou muito triste quando ele morreu. Lembro-me de um sonho que ela teve, no qual a minha avó Idalina pediu-lhe que cuidasse dele até o fim. Isso aconteceu alguns anos antes do final inevitável. E ela cumpriu a sua missão.



Vestida de Papai Noel no Natal de 1987 - Porto Alegre RS


É uma pena nós ficarmos velhos e doentes. Isto vai “embaçando” o brilho que a vida antes nos proporcionava. Continua-se vivendo, mas as coisas vão perdendo o seu colorido. Nos últimos tempos, tinha seguidamente tonturas. A diabetes e a hipertensão contribuíram para o desenlace final, principalmente quando passou a usar insulina. Foi preciso usá-la, para poder operar a perna. Depois deste evento, embora tratada, a sua saúde entrou em crise e culminou com a sua morte.


Meus pais na cidade de Carazinho - 1950


Uma pessoa deve ser lembrada pelas coisas boas que realizou durante a sua passagem pela vida, pelo que eu definiria como sendo a sua marca registrada. Assim, ela nos deixou o seu legado através de seus atos, palavras, pensamentos e exemplos a serem seguidos, a fim de que fortalecêssemos as nossas qualidades e superássemos as nossas fraquezas.


(Texto escrito no ano de 2002)




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