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sábado, 1 de novembro de 2014

Memórias de Estudante III - O Desenho




No passado gostava de rabiscar algumas coisas parecidas com desenhos, mas não cheguei a desenhar propriamente, como o fazem determinadas pessoas que já nascem com este talento. Os desenhos da minha infância eram os habituais produzidos pelas crianças. Nada tinham de extraordinário. Eram aquelas casas com chaminé fumegando, cortinas nas janelas, cercas em volta da casa, árvores em volta do terreno, nuvens esparsas no céu, um sol cheio de raios... Lembro-me que uma vez, numa turma de um ano qualquer do Colégio Sévigné, pediram que a gente fizesse um desenho, o que resultou posteriormente na visita de um vendedor de enciclopédias. Ele foi até a nossa casa, levando o meu desenho, para demonstrar que eu tinha “talento”, de modo que tal afirmativa impressionasse os meus pais a ponto de adquirirem os livros. Desenhei uma casa horrorosa, colorida de verde, certamente devendo ter gasto boa parte do lápis realizando tal proeza. A mãe meio que “esculachou” a minha obra de arte, dizendo que não via nada de mais, sabedora que tudo não passava de uma armação. A manobra do vendedor não dera certo...


Lápis Aquarela - 1998

Passado muito tempo, no ano de 1988, resolvi freqüentar um curso de desenho. Não estou bem lembrada, mas acho que se chamava Stylus a tal escola, situada na subida da Rua Dr. Flores, em direção à Av. Salgado Filho. No começo até que tudo ia bem. A minha professora era uma senhora chamada Ana e, se não fosse por ela, acho que teria continuado. Ela era muito crítica. Achava sempre que estava tudo torto. Só que, quando ela ia demonstrar como queria o esboço, eu achava que os traços dela não ficavam muito melhores do que os meus. A minha irritação era tanta que ela percebeu e passou a ser ríspida comigo. Acabei cancelando as aulas. Não tenho certeza, mas parte deste pessoal da escola passou a fazer parte da END, a Escola Nacional de Desenho, onde estudei depois. 


Carvão e Giz - 1988

Voltei às aulas somente em 1996, na END, que naquela época localizava-se na Galeria do Rosário. O meu professor chamava-se Fernando. Este foi um período muito produtivo. Ele era crítico, como todos os professores da área costumam ser, mas era legal e tinha muito talento. Ele gostava de trabalhar com histórias em quadrinhos. Nesta escola aprendi a usar grafite, nanquim, lápis-aquarela e os de cor, carvão, dermatograph, sanguina, conté e comecei a trabalhar com aquarela. Os meus temas preferidos eram as paisagens e as marinhas. Os temas mais odiados eram a naturezas-mortas e os objetos geométricos. A técnica que exige mais do aluno é a do nanquim. Mas pode ser dominada até a perfeição: é só não respirar nos momentos mais críticos...


Nanquim - 1997

Houve uma exposição, numa determinada época, em que os alunos da END participaram com suas obras devidamente escolhidas pelos professores. Não lembro onde esta foi realizada. Não fui até lá em função do meu horário de trabalho. Participei com um desenho a grafite, cujo tema foi escolhido e desenvolvido por mim, com a ajuda do meu professor. Era uma estátua de um grego junto a ruínas da antiga Grécia. Houve depois uma exposição dentro da própria escola, em que este e mais dois desenhos meus foram expostos. 


Grafite - Exposição 1996


O tempo passou. O curso devia durar cerca de um ano ou um ano e meio. Mas, quando chegou este suposto término, comecei a perceber que não era bem assim. Às vezes, os fins podem ser eternos... Não queria sair uma artista de lá, apenas ter o domínio básico das técnicas e receber o certificado da Escola. Por exemplo, eu via um colega de aula, bem jovem, que desenhava muito bem e que havia começado o curso antes de mim. Ele fazia aquarelas que nunca se acabavam, isto é, uma atrás da outra. Se ele que tinha talento estava naquela situação, imaginem o que aconteceria comigo? Mesmo largando o curso, continuei um bom tempo desenhando sozinha. O bom disto é que a gente escolhe o que quer desenhar, aquilo que contém um significado especial para nós. É horrível desenhar coisas por imposição. Apesar de tudo, valeu a pena ter lá estudado. 


Aquarela - 1998

Lembro-me, ainda, que costumava desenhar na Creche Cejuquinha, nas minhas horas vagas de Tesoureira, numa fase artística bem produtiva. Fazia as ilustrações para os meus poemas. Havia também aquelas vezes em que ficava desenhando nas férias, quando estava no apartamento da praia. Como foi bom aquele tempo... No ano em que escrevo estas memórias (2003), a motivação para continuar a desenhar ou pintar foi-se embora naturalmente. Quem sabe em algum dia do incerto futuro voltem a soprar os bons ventos da criatividade?


O que poderia dizer mais sobre a nobre arte do desenho e da pintura? Acredito que, lá pelas tantas, durante a realização da obra, o criador torna-se criatura. A obra é quem vai pedindo os seus traços, as suas sombras, os seus detalhes, definindo assim a sua misteriosa individualidade, como se fosse outro ser. É como se a intenção do artista deixasse de existir e, ao criar uma identidade para a obra, esta passasse a comandar o seu prosseguimento e a sua finalização. É como se a obra adquirisse vida própria! 


Para colorir a sua mente e o seu coração!



Texto escrito em outubro/2003 e revisado em novembro/2014.




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